São muitos os que obtiveram a nacionalidade por naturalização pela via do art.º 6.7 da Lei da Nacionalidade Portuguesa nº 37/81 de 3 de outubro, e que, no momento de passar a nacionalidade para seus filhos menores, se deparam com os problemas de provar a ligação dos menores com a comunidade portuguesa.
O exercício do direito à nacionalidade portuguesa para os filhos menores dos naturalizados, como por exemplo, no caso dos naturalizados por ser descendentes de judeus sefarditas, está causando um grande desconforto dentro da comunidade sefardita, dado que os processos de oposição, têm vindo a aumentar após o parecer técnico jurídico do Instituto dos Registos e do Notariado de 04/10/2022.
Se bem o legislador tentou não colapsar os tribunais administrativos, introduzindo presunções legais no caso das aquisições de nacionalidade por efeito da vontade dos casados e menores, a verdade é que, para estes últimos, as presunções legais não têm vindo a acrescentar nada, mostrando-se insuficientes.
A Lei da Nacionalidade que permitiu conceder a nacionalidade portuguesa aos descendentes de judeus sefarditas, e que veio repor uma injustiça histórica, pode ter o efeito contrário no caso dos filhos menores dos sefarditas, já portugueses, após a publicação do último parecer do IRN, que veio, na prática, dificultar o acesso aos filhos menores, exigindo que mostrem vínculos com Portugal e a comunidade portuguesa ainda que em tenra idade.
A exigência parece-nos pouco acertada e, em todo o caso, desprovida de bom senso quando falamos de menores com poucos anos de idade, sobre todo porque existiu até outubro de 2022 uma orientação muito mais favorável na própria conservatória, que foi totalmente contrariada pelo superior hierárquico e na nossa opinião, com fundamentos errados.
Os menores, filhos de pai ou mãe portugueses à data do nascimento, são considerados portugueses de origem e podem requer a inscrição do seu nascimento a qualquer momento, no registo civil português, em conformidade como art.º nº 1º al. c) da Lei da Nacionalidade.
Mas os filhos menores, nascidos antes da concessão da nacionalidade portuguesa de seus progenitores, não são considerados portugueses de origem, precisando de solicitar também a naturalização, pela via do artigo nº 2º da Lei da Nacionalidade Portuguesa, declarando a existência de vínculos com Portugal, sendo esta uma declaração necessária para obtenção da nacionalidade portuguesa.
A declaração de existência de ligação, é sempre dada no requerimento inicial e a não comprovação ou inexistência de ligação, é que pode dar lugar ao processo de oposição à nacionalidade portuguesa, participado pelo Conservador ao Ministério Público. Assim, o processo que se inicia em via administrativa, converte-se num processo judicial, no qual há lugar ao pagamento de taxa justiça para defesa.
Até outubro de 2022 a posição da Conservatória dos Registos Centrais, órgão que aprecia os processos, era bastante pacífica e, na prática, os Conservadores, ordenavam o registo de nascimento concedendo a nacionalidade aos menores, em virtude do princípio da unidade familiar, para os filhos menores de 14 anos, para os quais, atenta a sua curta idade, não se colocava o requisito da não condenação pela prática de crime. Nestes casos, existia, sempre, e na nossa opinião de forma acertada, a presunção de ligação e vínculo com Portugal, derivada da titularidade da nacionalidade portuguesa por um ou por ambos os progenitores.
Contudo, a partir de 4 outubro de 2022 o surpreendente parecer técnico jurídico n.º 6/ DGATJSR - SJ /2022, emanado do próprio Instituto dos Registos e do Notariado, superior hierárquico da Conservatória, veio contrariar a dita orientação interna de serviço nº 6/2019, revogando a mesma, indicando, em suma, que fora das presunções legais incluídas no artigo 56º do Regulamento da Nacionalidade, cabe aos Conservadores a avaliação das provas e bondade da participação ao Ministério Público, o qual vai decidir se converte ou não o processo, em contencioso administrativo para defesa nos tribunais portugueses [1].
E de facto a verdade é que, após outubro de 2022, são numerosas as participações dos Conservadores ao Ministério Público.
As presunções legais incluídas no Regulamento da Lei da Nacionalidade Portuguesa, para verificação da ligação dos menores são improváveis e impossíveis de satisfazer na prática, pois obrigam a residir legalmente em território português nos cinco anos imediatamente anteriores ao pedido ou, sendo menor em idade escolar, comprovar a frequência escolar em estabelecimento de ensino em território português.
Como bem é sabido, os menores descendentes de judeus sefarditas, não residem em Portugal, nem tal fora exigido aos pais, aquando do pedido de nacionalidade, pelo que se entende que a presunção está desfasada da realidade, não tendo nenhuma utilidade na prática.
De nada serve conceder aos pais a nacionalidade portuguesa, com o intuito de repor uma injustiça histórica, para logo vir negar a dos filhos, permitindo novamente a mesma injustiça. Os menores também são descendentes de judeus sefarditas.
Para todos os efeitos práticos e, apesar deste novo entendimento do IRN – que é o entendimento que seguirão os Conservadores - os menores, representados pelos pais, podem e devem continuar a introduzir os seus processos de naturalização, pois a prova de ligação efetiva à comunidade portuguesa, é variada e em todo o caso, fora das presunções legais, depende exclusivamente da apreciação subjetiva dos Conservadores e Conservadoras dos Registos Centrais, os quais recolhem a prova e decidem ou não a sua participação.
Devem, portanto, os interessados, preparar bem o caso antes de dar entrada e recolher essa prova evitando quaisquer possibilidades de participação ao Ministério Público.
O Regulamento da Lei da Nacionalidade determina no seu artigo 56º que constitui fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou da adoção, a inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional e, para que o Ministério Público possa opor-se à nacionalidade dos menores, terá sempre de provar a inexistência de vínculo com Portugal, tendo, portanto, o ónus da prova.
Os tribunais portugueses têm decidido por diversas vezes, e existe jurisprudência unívoca, que o ónus da prova recai no Ministério Público e que, portanto, cabe ao Estado provar que o menor não tem qualquer ligação com Portugal e não o contrário [2].
Também é importante esclarecer que a oposição à nacionalidade portuguesa dos menores, somente opera caso os Conservadores decidam participar o processo e, portanto, alertamos que existem formas de instruir os processos em via administrativa, que visam evitar essa participação pelo que é aconselhável a representação de advogado no caso.
[1] O parecer jurídico técnico pode ser consultado na sua totalidade na pagina do IRN que pertence ao Ministério de Justiça, conforme o seguinte link.
[2] Conforme acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo nºs 3/2016 e 4/2016 disponíveis no link.